29.10.08
Sobre "O caçador" e a Fome
O texto que publiquei no tópico anterior é o conto de abertura de um dos principais destaques deste ano na área da ficção científica no Brasil. A coletânea Fome é o segundo livro do publicitário paulistano Tibor Moricz e está programado para ser lançado no início de novembro pela Tarja Editorial, que vem a ser a editora que mais tem investido na produção nacional deste nobre gênero da literatura fantástica. Eu, que já havia resenhado e entrevistado Tibor anteriormente para o site Overmundo e para meu outro blog, tive a honra de ser convidado por ele para assinar o prefácio da obra. Abaixo reproduzo com a devida autorização do escritor e de seus editores a introdução escrita para um livro que, provavelmente, entrará com justiça para as listas dos melhores e mais ousados exemplos do que se pode esperar da FC produzida em nosso país.
Nas páginas seguintes, você terá a oportunidade de testemunhar a morte de, pelo menos, dois mitos. Um deles é a tradição bem-comportada da Ficção Científica brasileira, uma vez que o bom-mocismo desse gênero da literatura nacional raramente encontrou quem o desafiasse ao longo dos anos. Já nas linhas iniciais do primeiro dos quinze contos, Tibor Moricz trucida tal padrão estabelecido ao ir muito além do que fez, por exemplo, lá no início da década de noventa, o pioneiro e decano André Carneiro em sua singular utopia sexual Amorquia.
O paulistano descendente de húngaros (mais especificamente, sobrinho-neto de um dos maiores escritores e dramaturgos daquele país, Zsigmond Móricz) criou nesta coletânea uma distopia nada ambígua. Se em seu romance de estréia, Síndrome de Cérbero, ele fez uso de um tema clássico da FC mundial – a viagem no tempo – para analisar a angustiada relação de um filho com o pai ausente, aqui o autor volta a trabalhar com um cenário bastante conhecido, o do futuro pós-apocalíptico, mas com resultados bem mais cruentos.
Em Fome, o Caos e o Abismo de Nietzsche abusam, torturam e canibalizam um segundo mito, o do Bom Selvagem de Rousseau. A civilização acabou, os governos não existem mais, as relações familiares e as religiões ou se extinguiram ou surgem apenas como caricaturas farsescas. O que move os poucos sobreviventes é a urgência em atender àquela necessidade física que dá nome à obra. A fome, em suas diferentes e variadas manifestações, é a protagonista onipresente.
“Não eram tempos para analogias”. Dessa maneira se define o mundo descrito a seguir, em um dos primeiros contos. Mais à frente, em outro texto, retoma-se o assunto. “Um tempo onde a comida não existia. Um tempo onde a água pura não existia. Onde a sobrevivência suplantava tudo. Mas um tempo, sobretudo, onde todos, sejam caça ou caçador, sabiam que a vida é uma
questão de sonho e decepção”. É nesse tempo e nesse lugar que você está entrando agora, no espaço da Entropia. Não é bem o caso de dar as boas vindas, mas a verdade é que você está prestes a conhecer a distópica entropia de Tibor Moricz.
Vire a página por vontade própria.
Nas páginas seguintes, você terá a oportunidade de testemunhar a morte de, pelo menos, dois mitos. Um deles é a tradição bem-comportada da Ficção Científica brasileira, uma vez que o bom-mocismo desse gênero da literatura nacional raramente encontrou quem o desafiasse ao longo dos anos. Já nas linhas iniciais do primeiro dos quinze contos, Tibor Moricz trucida tal padrão estabelecido ao ir muito além do que fez, por exemplo, lá no início da década de noventa, o pioneiro e decano André Carneiro em sua singular utopia sexual Amorquia.
O paulistano descendente de húngaros (mais especificamente, sobrinho-neto de um dos maiores escritores e dramaturgos daquele país, Zsigmond Móricz) criou nesta coletânea uma distopia nada ambígua. Se em seu romance de estréia, Síndrome de Cérbero, ele fez uso de um tema clássico da FC mundial – a viagem no tempo – para analisar a angustiada relação de um filho com o pai ausente, aqui o autor volta a trabalhar com um cenário bastante conhecido, o do futuro pós-apocalíptico, mas com resultados bem mais cruentos.
Em Fome, o Caos e o Abismo de Nietzsche abusam, torturam e canibalizam um segundo mito, o do Bom Selvagem de Rousseau. A civilização acabou, os governos não existem mais, as relações familiares e as religiões ou se extinguiram ou surgem apenas como caricaturas farsescas. O que move os poucos sobreviventes é a urgência em atender àquela necessidade física que dá nome à obra. A fome, em suas diferentes e variadas manifestações, é a protagonista onipresente.
“Não eram tempos para analogias”. Dessa maneira se define o mundo descrito a seguir, em um dos primeiros contos. Mais à frente, em outro texto, retoma-se o assunto. “Um tempo onde a comida não existia. Um tempo onde a água pura não existia. Onde a sobrevivência suplantava tudo. Mas um tempo, sobretudo, onde todos, sejam caça ou caçador, sabiam que a vida é uma
questão de sonho e decepção”. É nesse tempo e nesse lugar que você está entrando agora, no espaço da Entropia. Não é bem o caso de dar as boas vindas, mas a verdade é que você está prestes a conhecer a distópica entropia de Tibor Moricz.
Vire a página por vontade própria.
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4 comentários:
Estou empolgado com a obra, mas confesso que quando li, logo pensei em algo "crashniano" com ares de FC.
Na espera de mais detalhes.
Sendo ou não, divulgando.
Fabi On Eves
Não acho que tenha tanto assim de Crash, mas só lendo para você poder julgar. Recomendo.
Abração, Fabi.
Ótimo prefácio, Romeu, dá vontade de ler. E a capa é linda mesmo, parabéns ao ilustrador e sucesso ao autor.
beijão,
merrel
Brigado, Helena (só pra te chamar por três nomes diferentes hoje)
Gostei bastante da oportunidade de prefaciar o livro. Foi um prazer.
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