por Rita Maria Felix da Silva
Na tarde fria e silenciosa de inverno, enquanto a terra descansava após chuva tão prolongada e o céu, pesaroso, escondia seu azul atrás das nuvens... Um vento intranqüilo soprava por aquela região, sobre a vila e os campos e na colina...
A casa abandonada ficava no topo da colina. Era uma construção secular, grande e firme, de arquitetura cinzenta e melancólica, ao seu redor estendia-se um jardim invadido por ervas daninhas, e suas janelas pareciam observar o mundo com infelicidade inconsolável.
Dentro da casa, Marina aproximou-se da janela. Seus olhos, através da vidraça, fitavam cheios de desejo e tristeza a vila lá embaixo.
— Não devia fazer isso. Seus pais vão reclamar.
Ela não se virou, pois sabia quem havia falado.
— Por que, Tia Matilde? — indagou Marina — Tenho tanta vontade de estar com o povo da vila.
— Para que? Nosso lugar é aqui.
— Eu... Anseio pelo que eles têm... Comem... Bebem... Fazem amor... Eles...
— Vivem, é a palavra que você está procurando, — completou Tia Matilde — é o tempo deles, não o nosso. É assim que o mundo funciona.
— Não entendo, tia. Meu coração suplica por contato, por ter o que aquelas pessoas têm.
— Você não tem mais coração, querida. Aliás, nenhum de nós tem. Já ouvi falar de alguns de nosso povo com idéias como essas suas. Acredite, o resultado nunca foi bom...
—... Fico confusa... Diferente da senhora e dos outros... Não sou apática, nem fria... Por que me sinto como se fosse um deles lá embaixo?— lamentou Marina.
Tia Matilde suspirou:
— Deve ser o destino fazendo uma piada de mau gosto. Às vezes, acho que a grande verdade por trás de tudo não é mais que isso... Bem, saia daí, mocinha, venha comigo. Você tem quase um século e meio de idade. Já devia estar acostumada.
Extremamente infeliz, Marina seguiu a tia pelos corredores sombrios e empoeirados da casa e amaldiçoou a si mesma por não ser capaz de chorar. Afinal, fantasmas não têm o privilégio das lágrimas.
Dedicado a Wesley Felipe de Oliveira (Monsieur Henri Corredeiras)
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